Pesquisadora analisa obra de Lewis Carroll pelo viés da psicanálise e tira conclusões para a educação |
:: Por Ruan de Souza Gabriel, da AUN/USP ::
[28/8 - www.mococa24horas.com.br] “No interior da toca do Coelho, Alice não se depara com um
mundo de fantasia, mas com um mundo real, no qual a linguagem não diz tudo. Ela
lida com o Outro que é sempre imprevisível. É a experiência do próprio
sujeito”, explica Juliana Radaelli, que defendeu sua tese de
doutorado intitulada O Nonsense no País das Maravilhas: o que Alice ensina à
educação, na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP).
O trabalho propõe uma articulação entre psicanálise,
literatura e educação. Articulação esta que Juliana considera complicada,
apesar de já tê-la feito em seu mestrado, quando se debruçou sobre a literatura
de Clarice Lispector em busca do sujeito psicanalítico.
Agora, no doutorado, Juliana retomou as obras mais famosas
do escritor inglês Lewis Carroll (1832-1898) – Alice no País das Maravilhas e
Alice Através do Espelho –, no contexto das teorias freudiana (Sigmund Freud,
1856-1939) e lacaniana (Jaques Lacan, 1901-1981) e procurou identificar o que
aparece de nonsene nos registros da psicanálise.
Diante do Outro - Juliana afirma que, por meio dos jogos de
linguagem e dos chistes, o texto de Lewis Carroll mostra que o campo da
linguagem se sobrepõe ao sujeito. “Estamos no beco sem saída da linguagem”,
explica.
A experiência de Alice no País das Maravilhas é a
experiência do sujeito diante do Outro. O Outro, na teoria lacaniana
representava, inicialmente, o campo total dos significantes. Posteriormente,
Lacan concluiu que o Outro era também era um sujeito desejante e “castrado”,
apresentava falhas e devia ser interpretado pelo sujeito. É aí que Alice se
perde.
Ao cair na toca do Coelho Branco, Alice cai pelas fendas do
simbólico (campo da linguagem). O simbólico não diz tudo e, ao relacionar-se
com o Outro, Alice se depara consigo mesma, explica.
Segundo Juliana, as aventuras de Alice no campo da linguagem
não se inserem no plano do imaginário, mas no plano do real, que, de acordo com
a teoria lacaniana, é aquilo que ainda não foi representado, um campo carente
de organização.
Diante do real - Mas o que Alice ensina à educação? Juliana
responde a essa pergunta afirmando que Alice pode ensinar o professor a não
recuar diante do real.
Como psicóloga, ela afirma que o número de crianças
encaminhadas a consultórios psicológicos por apresentarem problemas na escola
como dificuldade de aprendizagem ou distúrbio de déficit de atenção (DDA) é
cada vez maior. Os professores tendem a buscar respostas para os impasses que
encontram na sala de aula em outros campos do saber. Por exemplo: exigem que a
psicologia explique por que seus alunos não aprendem.
Juliana conclui que a psicanálise não deve se colocar como
mais uma teoria que diga ao professor o que fazer, pois essa posição pode barrar
sua criatividade para lidar com as situações encontradas em sala de aula. Assim
como Alice não recua diante dos seres estranhos que encontra, o professor não
deve recuar quando o real atravessa seu plano de aula. (Foto: reprodução)
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