:: Por Ricardo Ferraço e Luiz Flávio Gomes ::
42.844 mortes em 2010, o sinal ficou vermelho para a
carnificina no trânsito brasileiro. Nos últimos 30 anos (1980/2010) houve
crescimento de 115% no número de óbitos e aumento de 33% na taxa de letalidades
por 100 mil habitantes. Olhando só o último decênio (2001/2010), o crescimento
foi de 47,8% no número de mortes e aumento de 31% na taxa de 100 mil
habitantes. O número de fatalidades por 100 mil veículos vem caindo, mas a
mortandade brasileira continua sendo uma das maiores do mundo (4º no ranking
mundial).
Para se constatar o completo disparate nacional basta
recordar que a taxa média anual de redução nas mortes no trânsito na União
Europeia, no decênio 2000/2009, é de 5%. No mesmo período o Brasil teve
crescimento anual de 3,5%, sendo que o aumento na quantidade de veículos e na
população não apresenta grande distinção. O que a União Europeia está fazendo
de diferente? Está levando muito a sério um dos mais eficazes planos de
prevenção de acidentes e mortes no trânsito, que trafega pela Educação,
Engenharia (das estradas e dos carros), Fiscalização, Primeiros socorros e
certeza da Punição (EEFPP).
A Lei Seca (2008) provocou uma leve diminuição nas mortes em
2009. Mas o afrouxamento na fiscalização e na conscientização gerou, em 2010,
um assustador aumento de 13,9% nos óbitos. Também concorreu para isso a
impunidade criada pelo atual texto do crime de embriaguez ao volante que, ao
exigir a taxa de 6 decigramas de álcool por litro de sangue, só comporta
comprovação mediante exame de sangue e bafômetro, que o motorista não está
obrigado a fazer.
A lei deve ser modificada urgentemente, impondo-se o
abandono de qualquer taxa de alcoolemia, com a introdução no nosso país, como
premissa, do tolerância zero absoluto. O ponto de partida é uma infração
administrativa para quem dirige sob influência do álcool ou outra substância
análoga, mas com parcial incapacidade para dirigir veículo com segurança. A
infração se transformará em crime, punido com prisão de seis meses a 3 anos,
quando essa incapacidade for ostensiva, visível, constatável por exame clínico
ou outros meios de prova (testemunhas, vídeos, fotos etc.).
Brasil precisa de legislação moderna e eficiente - Com a fórmula sugerida supera-se tanto a dificuldade
probatória gerada pelo atual texto legal, que foi ratificada pela
jurisprudência do STJ, como o constitucionalmente questionável sistema de
presunção de culpabilidade aprovado em março deste ano na Câmara dos Deputados.
Para suprir outras lacunas e deficiências da lei brasileira
também deve ser criminalizada a conduta de quem, embriagado, expõe a perigo a
segurança viária (dirigindo em ziguezague, subindo calçada, violando o sinal
vermelho etc.). A pena passa a ser de um a cinco anos para o condutor que,
embriagado, causa lesão corporal em terceira pessoa. Será de quatro a oito anos
quando, em razão da condução embriagada ou de participação em “racha”, mata
alguém não intencionalmente (dolosamente).
Reiterando uma frase que já se tornou antológica – “Temos um
exército de homicidas e suicidas em potencial ao volante, que pilotam
estimulados por álcool, deprimidos por drogas ou excitados pela sensação de
onipotência” -, estamos colocando em pauta as propostas acima descritas, com o
objetivo de implantar no Brasil um programa de direção responsável, buscando o
mais amplo consenso entre o Senado, a Câmara dos Deputados e o Ministério da
Justiça, para dotar nosso País de uma legislação moderna e eficiente, capaz de
reduzir drasticamente os números dessa tragédia nacional.
Ricardo Ferraço é senador pelo PMDB/ES.
Luiz Flávio Gomes é jurista e cientista criminal. Fundador
da Rede de Ensino LFG, é codiretor do Instituto Avante Brasil e do
atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de
Direito (1983 a
1998) e Advogado (1999 a
2001).
(Este artigo foi publicado originalmente no site: institutoavantebrasil.com.br; fotos: arquivo pessoal e reprodução)